18/03/2014

O espólio de Florbela Espanca: quatro coleções

21 mar. - 17 abr. 2014


O espólio de Florbela Espanca: quatro coleções



À memória de Rui Guedes



(1) O Espólio documental Florbela Espanca na BPE

          No âmbito das atividades de celebração do Dia Mundial da Poesia, a Biblioteca Pública de Évora (BPE) divulga o espólio da poetisa Florbela Espanca, quer na sala de exposições quer no “site” da biblioteca, a partir de 21 de março.
        
          Esta coleção de documentos compreende manuscritos autógrafos (um caderno com dezoito sonetos, entre os quais «Ser Poeta»), iconografia e material concernente ao falecimento da poetisa aos 36 anos de idade. Destaca-se o conjunto de cartas de Florbela a Guido Battelli, carteio trocado nos últimos seis meses da sua vida, e que permitiu a Rui Guedes, na edição das “Obras Completas de Florbela Espanca”, recuperar os textos originais sem a montagem forjada pelo primeiro editor e admirador, o professor Guido Battelli.

          A exposição propriamente dita, na Biblioteca Pública de Évora, apresenta, de 21 de março até ao dia 17 de abril, uma mostra bibliográfica com parte desta documentação, acrescida de poemas publicados avulsamente em jornais e revistas e ainda os romances franceses cuja tradução foi da autoria da poetisa. Esta iniciativa de divulgar documentos de valor editorial, mas também simbólico e afetivo, da escritora alentejana contribuirá para um avanço significativo dos estudos florbelianos e, obviamente, será mais um motivo de satisfação para os leitores e verdadeiros fãs de Florbela. Aguarda-se a sua divulgação online e espera-se – espero eu, que provavelmente lá não poderei ir! – que os visitantes da mostra em Évora partilhem as suas impressões ou descobertas, nos vários locais de convívio com a vida e a obra de Florbela Espanca, como as redes sociais e a blogosfera.


          Todavia, esta coleção agora em mostra e que está ao cuidado da Biblioteca Pública de Évora constitui tão-somente um dos quatro acervos atualmente conhecidos da Poetisa. Alguns deles integram não apenas documentos mas também objetos de Florbela. Vejamos, de modo sintético, esses espólios.

(2) O Espólio do "Grupo Amigos de Vila Viçosa"

          O espólio de Florbela Espanca, propriedade do “Grupo Amigos de Vila Viçosa”, foi doado ao grupo pelo médico e último marido de Florbela, Mário Lage, e veio diretamente da casa do casal em Matosinhos. A doação do acervo ocorreu aquando da homenagem à poetisa em 1964, estando esta cerimónia igualmente documentada nesta coleção.
          Este espólio abrange cerca de cinquenta e cinco documentos e objetos pessoais e está a ser tratado no âmbito de um projeto da Universidade Évora, divulgado online sob o título  Florbela Espanca: o Espólio de um Mito, onde surge designado como Espóliode Vila Viçosa. O inventário foi elaborado de acordo com as normas e categorias estabelecidas pelo Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea da Biblioteca Nacional de Portugal (BNP) e está acessível online, bem como algumas das imagens dos documentos digitalizados.

(3) A “Coleção Florbela Espanca” na BNP

          Outra Coleção Florbela Espanca, bastante conhecida e consultada, encontra-se depositada na Biblioteca Nacional de Portugal, integrada no Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea (Esp. N10).
          Rui Guedes, o editor das “Obras completas de Florbela Espanca” em oitos volumes – incluindo a Fotobiografia e o completíssimo Acerca de Florbela: biografia, bibliografia, apêndices, discografia e índice remissivo geral, livrinho que todos usam mas poucos referem – descobriu este espólio. Florbela, antes de deixar António Guimarães para ir viver com Mário Lage, oferecera à sua cunhada todas as suas coisas queridas e estas permaneceram, guardadas ou esquecidas, num sótão cerca de seis décadas; em 25.10.1982, já em posse do neto dessa senhora, na sua casa em S. João do Estoril, são adquiridas por Rui Guedes.
          Este espólio, contendo cerca de 39 documentos, está devidamente inventariado e digitalizado, disponível ao público em microfilme e online, e espelha a produção poética de Florbela entre 1915 e 1922, incluindo os autógrafos de primeiras e segundas versões dos seus poemas, algumas cartas e documentos biográficos. Veja aqui o resumo.

(4) O “Espólio Florbela Espanca” na BMFE

          Finalmente, outro precioso “Espólio Florbela Espanca” encontra-se à guarda da BibliotecaMunicipal Florbela Espanca de Matosinhos, terra em que a poetisa viveu com Mário Lage e onde viria a falecer. Os documentos deste acervo integram os Espólios de Escritores do arquivo da biblioteca e já se encontram inventariados: a sua catalogação está acessível no catálogo online da biblioteca [pesquisar com palavra-chave “Florbela Espanca” e ordenar por “data de publicação”]. Compreende iconografia, manuscritos da autora, epistolografia e outros documentos pessoais ou de terceiros. Este espólio foi adquirido pela Câmara Municipal de Matosinhos, em 2006, à filha da escritora e biógrafa da poetisa, Maria Alexandrina, que já o recebera do segundo marido de Florbela, António Guimarães. Não admira, pois, que do conjunto de cartas desta coleção tenha sido composto o volume de Maria Lúcia Dal Farra – Perdidamente: correspondência amorosa 1920-1925 (2009).

***

          Notícias, artigos, teses académicas sobre a obra e a vida de Florbela Espanca continuam a ser redigidos, divulgados e lidos numa dinâmica espantosa e a uma escala global; encontros, colóquios e exposições – como esta agora na Biblioteca Pública de Évora, vão ocorrendo, com interesse renovado, despertando o amor crescente pelo pensar e sentir de uma mulher da primeira metade do século XX português, que é atualmente um fenómeno nas redes sociais – o seu nome, o seu rosto e os seus poemas são mais conhecidos e celebrados que o de muitos escritores canonizados pela crítica ou a Academia.
          Urge um inventário sistemático e rigoroso da bibliografia ativa (textos em volume e avulsos, éditos e manuscritos), articulando os quatro espólios atualmente conhecidos da Poetisa. Igualmente, sente-se a carência de um levantamento, o mais exaustivo possível, da fortuna crítica sobre a obra da poetisa, de modo a permitir avaliar o que já foi dito e assim abrir caminho a novas ou mais ousadas interpretações dos seus textos, líricos, narrativos e epistolares; dos sonetos mas também das quadras ao gosto popular.

JCCanoa


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